ClockWork

Drumming & Daniel Bernardes, Na sequência do aclamado “Liturgy of the Birds” em homenagem a Olivier Messiaen, “Clockwork” marca uma nova colaboração entre Daniel Bernardes e o Drumming-GP em homenagem a György Ligeti. Figura incontornável da música do século XX emprestou obras suas às bandas sonoras de filmes como “2001: A Space Odyssey”, “The Shining” e “Eyes Wide Shut” de Stanley Kubrick. Dono de um estilo muito eclético, Ligeti explorou texturas de grandes massas sonoras – cunhando, a esse propósito, o termo micropolifonia, e numa fase posterior debruça-se sobre a rítmica africana como atestam os seus célebres estudos para piano com influências dos universos do Jazz e do Rock. A natural paixão de Daniel Bernardes pela música do mestre Húngaro tornaram claro que este seria o passo natural para uma segunda aventura em colaboração com o Drumming GP.

Compositor e pianista eclético, Daniel Bernardes tem escrito para alguns dos principais solistas portugueses, Teatro, Televisão e Cinema. Em 2019 lança “Liturgy of the Birds” em parceria com o Drumming GP – agrupamento de referencia mundial no universo da percussão contemporânea – disco aclamado pela crítica nacional (Jazz.pt ; nomeação para disco do ano nos prémios Play) e internacional (destaque nas escolhas do editor da revista JazzTimes USA e presença em vários programas de rádio da especialidade). Apesar da pandemia “Liturgy of the Birds” percorreu o país apresentando-se em algumas das principais salas portuguesas: Fundação Gulbenkian e Centro Cultural de Belém -Lisboa, Casa da Música – Porto, Teatro Baltazar Dias – Funchal, Teatro Stephens – Marinha Grande, Centro Cultural Benedita – Alcobaça, Centro Cultural e Congressos – Caldas da Rainha, Teatro Garcia de Resende – Évora e Salão Medieval da Universidade do Minho de Braga.

Os projectos de Daniel Bernardes envolvem um ecletismo assumido e um diálogo entre diferentes estéticas musicais e muitas vezes com dimensões trans-disciplinares. Em “Liturgy of the Birds” Bernardes mergulhou no universo de Olivier Messiaen, figura incontornável da música do século XX, e pô-la em diálogo com o Jazz e a improvisação.

O projecto que aqui se apresenta segue um paradigma semelhante, um crossover entre a música contemporânea e o Jazz, debruçando-se agora na obra do compositor György Ligeti cujo centenário se comemora em 2023.

O grande público conhece Ligeti pela mão de Stanley Kubrick que integra a sua música no filme 2001: Odisseia no Espaço, e filmes subsequentes. Numa altura em que a vanguarda musical estava muito polarizada, numa dicotomia Europa–Estados Unidos, este sucesso popular proporcionou a Ligeti uma grande liberdade artística com a qual ele forjou um percurso que prima pelo ecletismo, e uma relativização dos dogmas que permeavam a composição musical.

Ligeti trabalhou o universo da micro-polifonia, um processo que procurava as texturas e grandes massas sonoras tornando impossível a percepção das vozes individuais em obras como “Ramifications”, “Atmospheres”, “Lontano” entre outras.

O ritmo foi outra das grandes áreas exploradas por Ligeti, desde as primeiras influências da música tradicional húngara pela mão de Bartok mas também pela música africana com um ADN rítmico muito próprio “Concerto para Piano” “Concerto para Violino” “Estudos para Piano”.

A Liturgia dos Pássaros

Daniel Bernardes toma contacto com a música de Olivier Messiaen na adolescência, ainda em contexto formativo, desenvolvendo desde logo um fascínio imediato pela “Sinfonia Turangalîla”. Embora Messiaen nunca tenha trabalhado ou demonstrado particular interesse pelo mundo do jazz, era famoso pelas suas improvisações nomeadamente por ocasião das missas na Igreja da Santa Trindade em Paris onde, ao órgão, improvisava de acordo com os diferentes momentos da cerimónia. Este aspecto, aparentemente irrelevante, é importante para percebermos uma certa proximidade, sobretudo harmónica, com os paradigmas do jazz tradicional. O jazz tira partido dos antigos modos Gregos e Messiaen, seguindo o mesmo paradigma, cria o seu universo harmónico através da construção dos seus próprios modos.

Esta proximidade de natureza faz com que a linguagem harmónica de Messiaen se torne um caminho possível para o jazz contemporâneo, podendo os modos de Messiaen servirem de complemento aos recursos harmónicos proporcionados pelos modos gregos. Foi por esta razão que Daniel Bernardes, tendo durante anos estudado a linguagem do jazz, se lançou a explorar as possibilidades do sistema harmónico de Messiaen. Esboçando nova música e com crescente entusiasmo, rapidamente surgiu a ideia de juntar um trio de piano jazz a um ensemble de percussão.

Com este propósito dirige o convite ao Drumming Grupo de Percussão, o mais importante ensemble de percussão do panorama musical português, convite este prontamente aceite pelo seu Director Artístico, Miquel Bernat. A completar o trio jazz o baterista Mário Costa, um dos mais requisitados bateristas portugueses com colaborações com nomes como Wynton Marsalis, Joachim Kuhn, Hugo Carvalhais assim como a famosa fadista Ana Moura. No contrabaixo lugar a António Augusto Aguiar, contrabaixista de referência do meio do jazz com inúmeras colaborações com as principais figuras do jazz nacional, mas também música contemporânea, nomeadamente o Remix Ensemble onde é o contrabaixista titular.  

Neste projecto, Bernardes lança-se ao desafio de escrever música segundo as técnicas e estética de Messiaen que depois mistura com o seu jazz contemporâneo, uma experiência inédita e onde presta homenagem ao mestre Francês.